Paulo Reis, diretor técnico do atletismo do Sporting, relançou uma ideia antiga, ao dizer que “a regra dos estrangeiros tem de mudar”, na sequência do Nacional de Clubes, conquistados pelo Benfica em masculinos e pelos leões em femininos. Não foi preciso muito para que o Benfica percebesse que a frase se dirigia à política pós-Pichardo do clube encarnado.
Reis fez um pedido para que a Federação Portuguesa de Atletismo avance com mudanças nas autorizações de inscrição: "Houve dois protestos, que tenha conhecimento, e questões complicadas em termos de inscrições, mas neste momento acabou. Penso que toda a gente já percebeu que a questão das regras dos estrangeiros tem que mudar, e penso que a Federação também entendeu”.
O diretor técnico do atletismo leonino comparou então o “aproveitamento” feito pelo Benfica com a atuação do Sporting: “Houve uma abertura para os atletas ucranianos se inscreverem, que nós aproveitámos [com Andrii Protsenko e Roman Kokoshko], e houve uma falha em termos de análise regulamentar que o Benfica aproveitou com a inscrição de cubanos [Reynier Mena e Roger Iribarne]. O regulamento diz que os atletas (…) têm que ser oriundos de países que tenham acordo de reciprocidade no âmbito da cidadania com Portugal ou outro país da União Europeia. Nós não encontrámos nenhum acordo desses relativamente a Cuba, pedimos esse acordo à Federação, nunca nos chegou”, disse, citado pelo "Record"
Do lado do Benfica, Ana Oliveira não fez cerimónias nos comentários à posição do rival da segunda circular, mas também à FPA: “Foi uma maldade da Federação colocar o Nacional de Clubes nesta altura do ano, para nós e para os outros clubes. Quase todos os outros países o fizeram no dia 26 de junho. Foi uma época muito extensa, com muitos atletas a fazer muitos meetings para terem ranking para o Mundial. Tivemos atletas que vieram há 48 horas dos Estados Unidos, com emoções positivas e negativas, com jet lag. É uma grande maldade também considerando que temos os Europeus em três semanas. Temos muitos mais atletas masculinos com objetivos internacionais, e a rivalidade entre Benfica e Sporting é muito maior no masculino do que no feminino".
A diretora do atletismo benfiquista virou-se então para o Sporting, que considera não ter cumprido os regulamentos. Ao "Record", Oliveira disse: “Quero dar os parabéns e agradecer ao Sporting a forma como encarou este campeonato, julgando que podia ganhar, felizmente não ganhou, mas fez-nos estar mais atentos, mais rigorosos".
Ana Oliveira alongou o seu sarcasmo: “É bom para o atletismo português, se o Sporting cumprir os regulamentos. Fizemos protestos, porque pelos vistos podemos participar com mais do que dois estrangeiros. Pelos vistos, para ser refugiado basta vir na véspera e competir, se soubesse que era assim, também podíamos ter contratado outros estrangeiros e não fizemos. As regras não são claras, pedimos apoio ao nosso departamento jurídico relativamente à interpretação da regra. Fizemos todo o campeonato como se estivesse tudo a acontecer de forma normal, porque sabemos que o Benfica nunca ganha um protesto”.
"Foi um campeonato confuso desde o início. Um atleta vem a Portugal e passa a ser refugiado. Dá uma conferência depois de ganhar uma medalha a dizer que não sabe ainda onde vai ficar. Dá três ou quatro países, menos Portugal… Apelo à Federação que se esclareça, que se defina, porque se continuar assim não sei qual é a opinião do Benfica, mas se não houver bons calendários, boa gestão de pistas, boa comunicação e ter um regulamento que se entenda, sinceramente temos que escolher se queremos mais Pichardos, mais atletismo internacional, ou se queremos que a Federação monte o circo e nós continuamos a ser 'palhaços' e a vir aqui atuar, com todo o respeito”.
O conflito sobre a naturalização dos atletas começou, na verdade, com a troca de clube de Nelson Évora, que, em 2016, deixou o Benfica e assinou pelo Sporting. Os encarnados contrataram então o cubano Pedro Pablo Pichardo, que foi naturalizado português em tempo recorde. Criou-se uma rivalidade com Évora que atingiu níveis pouco saudáveis nos Jogos Olímpicos de Tóquio 2020 (jogados em 2021). Desde então, a naturalização de atletas tem sido tema corrente e aceso no debate entre os rivais de Lisboa.