“Façam magia”. E eles fizeram: Estrela da Amadora elimina Farense da Taça
Tal como em 1990, o Estrela ganhou ao Farense na Taça de Portugal, por 2-0. Vitória justa do David do Campeonato de Portugal, que eliminou o Golias da I Liga e que deixa uma certeza: o "velho" Estrela está de volta
03.12.2020 às 16h55

RODRIGO ANTUNES
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"É para ver a bola".
Às 14h, havia apenas uma porta do estádio José Gomes aberta, para permitir a entrada, por um lado, de "press", por outro, de "VIP". Foi precisamente por essa porta que entrou, ou melhor, tentou entrar, um sócio do Estrela. Mostrou o cartão, disse o nome e o assessor do clube ainda lhe fez a vontade, pesquisando na lista se de facto o senhor, já com idade de quem provavelmente assistiu à única conquista do Estrela na Taça de Portugal, em 1990, era um dos convidados.
Não era.
"Então se for à bilheteira ainda posso entrar?"
Foi um pedido quase enternecedor, misturando amor pelo clube com ignorância pelas novas regras que não permitem, lamentavelmente, a entrada de adeptos nos estádios, dada a pandemia de covid-19. Ao ouvir a justificação que lhe deram, o senhor encolheu os ombros e foi-se embora.
Mas nem assim faltou apoio ao Estrela. Nos prédios à volta do estádio José Gomes, viam-se camisolas e cachecóis pendurados nas janelas e até quem gritasse pelo clube, tentando espreitar para o relvado. Lá dentro, numa das paredes do complexo, pintado de fresco, um apelo da Magia Tricolor, claque amadorense, ressoava pela imponência das letras.
"Façam magia", lia-se, ao lado de um troféu da Taça, que o Estrela conquistou precisamente frente ao Farense, em 1990, por 2-0.

A história pode ser motivante e, neste caso, era evidente que a equipa que ainda joga no Campeonato de Portugal - para onde subiu esta época, depois da fusão com o Sintra Football - partia para esta 3ª eliminatória da Taça com muito mais gana do que o Farense, equipa agora de I Liga, escalão para o qual subiu, curiosamente, com uma mãozinha de André Geraldes, então administrador da SAD de Faro e agora presidente da SAD da Amadora.
Foi precisamente por isso que Rui Santos, treinador do Estrela, disse à Tribuna Expresso, em jeito de brincadeira, que este era "o jogo da época", e que uma vitória impediria que fosse despedido até ao final de 2020/21 - e até havia prémio de jogo.
E a verdade é que, desde o primeiro minuto, este sempre pareceu o jogo da época para o Estrela. Apesar de Sérgio Vieira não ter mexido muito no onze base do Farense, com exceção para a troca de guarda-redes - saiu Defendi, entrou Hugo -, foi quase sempre a equipa de Rui Santos a estar por cima.
Depois de uma primeira ameaça do médio Horácio Jau, foi o colega de meio-campo, Hélder Laton, a fazer o primeiro golo, na sequência de uma bola perdida na área, após um canto, ao quarto de hora de jogo.

RODRIGO ANTUNES
O Farense respondeu logo a seguir, com um remate de Ryan Gauld a ser defendido por Filipe Leão, mas pouco mais mostrou. Pelo contrário, pareceu sempre acomodado com as circunstâncias, enquanto o Estrela ia criando mais perigo, quase sempre através de remates de longe, novamente por intermédio do incansável Laton.
Em cima do intervalo, Sérgio Vieira já demonstrava a insatisfação, ao colocar três jogadores em aquecimento, e teria mesmo de fazer entrar um deles antes dos 45', dada a lesão do lateral Alex Pinto. Isidoro, que entrou para o lugar do colega, causou logo problemas, ao irromper para a área adversária e ser impedido de entrar quase em cima da linha - livre perigoso que o Farense não aproveitou.
Ao intervalo, aí sim, mudanças na equipa visitante, à procura de reverter o resultado: Licá, Patrick e Madi Queta entraram para os lugares de Nicola, Bilel e Filipe Melo.
Mas o trio mal teve tempo de tentar fosse o que fosse. O Estrela voltou a entrar forte e, logo ao primeiro minuto, remate de Chapi Roman que embateu num adversário e, num segundo remate, Horácio Jau fez mesmo o 2-0.

RODRIGO ANTUNES
A fortuna do Estrela era o infortúnio do Farense, agravado posteriormente pela lesão da voz de comando da defesa, o central César, e a verdade é que, até ao final do jogo, as melhores oportunidades foram sempre dos amadorenses.
Paollo Madeira e Horário Jau estiveram perto do 3-0, enquanto Licá e Patrick ainda tentaram o 2-1, mas sem grande ímpeto.
Até ao final, o Estrela controlou os acontecimentos na perfeição - já nos descontos, o central Yuran até se deu ao luxo de enganar um adversário, no seu próprio meio-campo, com um toque de calcanhar. Magia.

RODRIGO ANTUNES
Após o apito final, festa da grossa na Amadora: ouviram-se buzinas de automóveis na rua e, pasme-se, até houve fogo de artifício tricolor, com os tons de vermelho, branco e verde.
Tal como em 1990, o Estrela venceu o Farense na Taça, por 2-0, agora não na final, mas na 3ª eliminatória. Na fase seguinte, irá defrontar o Anadia, também do Campeonato de Portugal. Chegue onde chegar na Taça, uma coisa é certa: o Estrela está de volta.
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