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Futebol internacional

De bicicleta, Fred disse adeus de vez: “É o clube mais humano que eu conheci em toda a minha vida”

O regresso ao Fluminense, em 2020, foi de bicicleta: o futebolista fez cerca de 600 quilómetros entre Belo Horizonte e Rio de Janeiro, criando a "Tour do Fred", garantindo doações e cestas básicas para comunidades pobres e funcionários do Flu com salários baixos. Este sábado, no adeus derradeiro ao futebol e ao clube que mais amparo lhe ofereceu, Fred deu uma volta olímpica ao Maracanã numa bicicleta

Hugo Tavares da Silva

Andre Borges

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O Maracanã encheu-se de gente para a despedida de Frederico Chaves Guedes, de 38 anos, um futebolista profissional que começou em 2003 no Atlético Mineiro e que jogou até 9 de julho de 2022, num Fluminense-Ceará (entrou aos 78').

O Flu, um dos gigantes do Rio de Janeiro, foi aliás a sua casa predileta, a mais especial, a que amou mais tempo. Foram mais de 10 anos com a camisa tricolor, tendo assinado em 2009, após quase quatro temporadas no Lyon. “Quero agradecer toda essa receptividade da torcida do Fluminense. É maravilhoso o que eu estou sentindo. Para falar a verdade, nunca vivi coisa tão gostosa dentro do futebol. Cheguei a ficar arrepiado quando entrei e vi a torcida cantando e gritando o meu nome”, admitiu na altura, começando aqui o encanto com o clube das Laranjeiras.

Depois do jogo com o Ceará, o protagonista da festa deu uma volta olímpica ao Maracanã de bicicleta, o veículo escolhido para viajar de Belo Horizonte para o Rio de Janeiro, quando regressou ao clube, em 2020, proveniente do Cruzeiro. Foram qualquer coisa como 600 quilómetros e quatro dias. A "Tour do Fred" foi uma ação solidária, garantindo doações e cestas básicas para comunidades carentes e funcionários do Fluminense com salários baixos. A bicicleta, concluída a viagem, foi também leiloada.

Fred é símbolo de longevidade, golos e troféus. De acordo com o Lance, o avançado brasileiro que conquistou ali no clube de Chico Buarque dois troféus do Brasileirão e dois Cariocas pendura as botas com algumas marcas importantes: segundo maior goleador da história do Fluminense (199), maior artilheiro da Copa do Brasil (37), segundo maior goleador do Campeonato Brasileiro (158 golos) e o maior desde que se contam os pontos corridos. Mais: é o segundo maior goleador brasileiro na Libertadores (25) e, para além dos mais de 400 golos na carreira, o histórico número 9 encaixou-se também no top-15 dos jogadores com mais partidas pelo Fluminense (382).

Andre Borges

Na hora do adeus não marcou, como fizera na jornada anterior contra o Corinthians, mas deixou algumas palavras, emocionado. “Prometi que não iria chorar, porque já chorei demais no último sábado. Tenho que conseguir expressar um pouco da gratidão que eu tenho pelo que esse clube fez por mim, que essa torcida fez por mim. Tenho certeza que é o clube mais humano que eu já conheci em toda a minha vida”, desabafou.

A carta de amor que se espalhava pelo ar continuou: “A gente valoriza muito as vitórias, o sucesso, os golos e os títulos. Mas, no Fluminense, o que mais me marcou foram os momentos em que eles me ajudaram quando eu queria desistir. Nos momentos de medo, de fraqueza. Quero agradecer do fundo do meu coração a todos os tricolores. Vou aposentar-me com essa camisa, mas ela estará sempre tatuada no meu peito”.

Fred chamou “guerreiros” aos companheiros, exaltou o que estão jogando neste momento, a qualidade do jogo, e agradeceu ao treinador Fernando Diniz “tudo” o que está a fazer pelo clube. Mas o amor, aquele que se entranha nos ossos, debaixo da pele, nas lágrimas, na pele de galinha, no pé direito, no pé esquerdo, na cabeça e no coração, está apontado para as pessoas que adoram o Fluminense.

“O que é mais bacana é quando saio na rua… gente de oito a 80 anos… eu vejo crianças, pais, idosos com carinho louco por mim. Não esperava isso tudo, de verdade. Acho que não sou merecedor disso tudo, porque se a gente for analisar o que eles fizeram por mim é impagável, é uma dívida eterna. Brincam que o Fred é eterno, mas a minha dívida com eles é eterna. Só quero agradecer a todo mundo que trabalhou comigo, funcionários, jogadores, técnicos, aos adversários, os clubes”, disse ainda o agora ex-futebolista, natural de Teófilo Otoni, em Minas Gerais.

Andre Borges

A carreira internacional de Fred também é relevante. Em França, com a camisola branquinha do Lyon, conquistou três edições da Ligue 1, uma Taça e três Supertaças. Com a camisola que faz brilhar os olhos de todos os garotos nascidos naquele país do futebol, o artilheiro jogou dois Campeonatos do Mundo, em 2006 e o malfadado 2014, em casa, que ditou o seu adeus àquelas andanças. Atuou ainda em três Copas América, conquistando uma delas em 2007, um troféu que juntou ao triunfo nas Taças das Confederações, em 2013, em que marcou dois golos no 3-0 à Espanha.

Com um curso de gestão na mochila, segue-se o de treinador. O futuro está incerto, para já pede descanso, uma pausa. “Tenho o sonho de estar aqui de alguma forma. Não sei o que vai acontecer. Não vou abrir mão de adquirir o máximo de conhecimento possível. Já fiz o curso de gestão, vou fazer o de treinador em agosto. Vou preparar-me da melhor maneira. Não quero estar no Fluminense pela história como jogador apenas. Gostaria de estar aqui para ser útil de alguma forma. Sei que tenho algumas qualidades, alguns defeitos, mas posso ajudar de alguma forma. Eu acho que vou tirar um tempo, mas não sei o que o Fluminense vai fazer na minha vida”, reconheceu.

Sobre quem deixa para trás, depois dos elogios aos futebolistas das Laranjeiras e da gratidão perante Fernando Diniz, Fred acredita que o Fluminense será campeão nesta temporada. Com a vitória sobre o Ceará, no Maracanã, o Flu saltou provisoriamente para a segunda posição do Brasileiro, a dois pontos do Palmeiras (com menos um jogo).