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“Lançou-se a pedra e escondeu-se a mão”: treinador da seleção espanhola feminina reage à renúncia de 15 jogadoras

A conferência de imprensa em que Jorge Vilda escolheu uma equipa praticamente nova para defrontar Suécia e Estados Undos, em outubro, durou mais de uma hora. O selecionador disse que faltou clareza na mensagem das futebolistas que renunciaram à seleção e admite um regresso ao passado se as jogadores corresponderem às exigências da federação, ou seja, se pedirem desculpa. “Estou profundamente magoado porque acredito que é uma situação injusta. Ninguém a merece, não é bom para ninguém e creio que é um [caso] ridículo a nível mundial”

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Sem surpresas, o nome das 15 jogadoras que assinaram uma carta em que pediam para não serem chamadas à seleção por divergências com o treinador, Jorge Vilda, não aparecem na convocatória para os próximos dois jogos. Ausentes estão também Jenni Hermoso, uma das melhoras jogadoras do mundo e que recentemente se colocou ao lado das colegas, Irene Paredes, a capitã espanhola que embora não tenha assinado a carta apoiou a luta, e Alexia Putellas, lesionada. Ainda não foi desta que Brenda Pérez, com um arranque de época tremendo no Sporting, foi chamada.

Esta sexta-feira foi a vez de Vilda dar a cara e comentar o caso que levou à insatisfação e afastamento de 15 futebolistas. O espanhol disse que a mensagem das atletas não foi clara e pediu às jogadoras – a quem a imprensa vai chamando “rebeldes” – para se explicarem. Resumindo, se pedirem desculpas e assumirem o erro, “isso poderia ser um princípio para retomar o que havia no passado”. Foi esta a comunicação da Real Federação Espanhola de Futebol (RFEF) e o treinador está na mesma página, indicou.

Durante a conferência de imprensa, que durou mais de uma hora, ouviram-se as ideias e os desabafos do selecionador, de 41 anos. “Desafio qualquer um a dizer que não houve respeito ou que houve qualquer falha no meu comportamento. Lançou-se a pedra e escondeu-se a mão”, disse o treinador.

Em cartas enviadas por e-mail à federação, as 15 futebolistas questionavam a continuidade do selecionador, afirmando que não voltariam enquanto a situação não mudasse, já que, acusaram, afetava “de maneira importante” o “estado emocional” e a “saúde” delas, podia ler-se então no “El País”.

A RFEF, presidida por Luis Rubiales, respondeu dizendo que não ia “permitir” que as jogadores “questionem” a continuidade de Vilda. O comunicado dizia mais: “A federação não vai admitir nenhum tipo de pressão por parte de nenhuma jogadora na hora de adotar medidas do âmbito desportivo. Este tipo de manobras encontra-se longe do exemplo e fora dos valores do futebol e do desporto e são nocivas”.

Depois do ping pong entre jogadoras e federação, foi a vez do treinador abordar o tema delicado, que coloca um ponto de interrogação no desenvolvimento do futebol feminino em Espanha. “Estou disposto a responder a qualquer pergunta que me façam. Com a verdade se chega longe. Deixámos a pele por e para o futebol feminino”, começou por dizer. Vilda afirmou que sente o “máximo respeito pelas jogadores” que agora não foram convocadas.

Angel Martinez

Jorge Vilda agradeceu também a todos os selecionadores das categorias masculinas pelo apoio e mensagens que recebeu nestes últimos dias. “A primeira coisa que quero comentar é que, pela falta de clareza na mensagem das jogadores, houve dúvidas sobre poder ter acontecido algo extra-desportivo nisto que está a acontecer”, alertou.

O selecionador, que admitiu ter passado dias difíceis, revelou que nunca ponderou a demissão, algo que supostamente nunca foi exigido pelas jogadoras. E a solução para este imbróglio? “Não tenho hipóteses. A solução são as 23 futebolistas da lista e enfrentar os jogos. Preparar os jogos e olhar para a frente. Aspirar ao máximo que pode jogar uma futebolista.”

Vilda não confirmou se conversou com algumas das 15 futebolistas que renunciaram à seleção. “Estou profundamente magoado porque acredito que é uma situação injusta. Ninguém a merece, não é bom para ninguém e creio que é um [caso] ridículo a nível mundial. O que mais me magoa é o que tínhamos e o dano que se está a fazer ao futebol feminino”, disse o treinador, que leva 21 anos no futebol profissional e que garante estar aberto ao diálogo e a assumir erros.

Como é possível continuar assim?, perguntaram-lhe na conferência de imprensa. “Está claro que é uma situação complicada e difícil. Estou a sofrer mais pela minha família e eles estão mais afetados”, explicou, garantindo que julga estar correto e que isso lhe dá mais energia. “Agora vêm as exigências dos resultados, mas temos de dar tempo. Peço tempo e respeito para estas jogadoras.”

A nova versão da seleção espanhola conta com as futebolistas Misa Rodríguez (Real Madrid), Sun Quiñones (Athletic), Enith Salon (Valencia), Sheila García (Atlético), Oihane Hernández (Athletic), Ivana Andrés (Real Madrid), Ana Tejada (Real Sociedad), Rocío Gálvez (Real Madrid), María Méndez (Levante), Olga Carmona (Real Madrid), Nuria Rábano (Barcelona), Teresa Abelleira (Real Madrid), Anna Torrodá (Valencia), Maitane López (Atlético), Maite Oroz (Real Madrid), Irene Guerrero (Atlético), Claudia Zornoza (Real Madrid), Marta Cardona (Real Madrid), Ane Azcona (Athletic), Esther González (Real Madrid), Alba Redondo (Levante), Athenea del Castillo (Real Madrid), Salma Paralluelo (Barça)

“Em Espanha há mais de 70 mil jogadores e a federação está por cima de tudo”, avisou Vilda. Estas 23 futebolistas vão integrar o estágio da seleção que começa na segunda-feira, na Ciudad del Fútbol de Las Rozas. Os próximos desafios, com vista ao Campeonato do Mundo de 2023, serão contra Suécia e Estados Unidos, a 7 e 11 de outubro.