Uma década depois do surgimento em força do futebol na China, com o dinheiro a impressionar os mercados internacionais e a certeza de que a liga chinesa seria a próxima big thing, tudo parece ter-se virado ao contrário. Com uma grande ajuda da pandemia com aparente origem no país, o futebol chinês já não promete e tem no futuro apenas incertezas.
No fim de semana passado, a China renunciou aos direitos de organizar a fase final da Taça da Ásia. O anúncio citou o possível regresso em força da covid-19 como motivo para a devolução, mas a verdade é que, diz a "Reuters", poderá ser o próprio futebol chinês a estar em causa num futuro próximo.
Nove estádios a estrear e um renovado faziam crer que a Taça da Ásia iria servir para mostrar ao mundo que a China estava pronta para organizar um Campeonato do Mundo de futebol. De acordo com a agência noticiosa, essa seria, aliás, uma grande ambição do próprio presidente Xi Jinping. O guião estava pronto e o cenário preparado, mas dificilmente o filme será feito.
O impacto de uma crise sanitária global e o objetivo chinês “zero covid”, a par de dificuldades no setor financeiro que terão arruinado muitos dos clubes do país, avariaram o jogo e afastaram o(s) interesse(s).
Mark Dreyer, jornalista do “China Sports Insider”, disse à Reuters: “O brilho desapareceu do ecossistema desportivo chinês. Quem confiaria à China a organização de um Mundial tendo em conta tudo o que temos visto nos últimos dois anos de pandemia? Em termos de futebol, basicamente presenciámos a explosão e a destruição”.
É difícil lembrar como, há 10 anos, o Guangzhou Evergrande apresentou o campeão do mundo Marcello Lippi como o seu novo treinador. O salário de Lippi seria de 10 milhões de euros por ano. Dois anos depois, com uma Liga dos Campeões Asiática debaixo do braço, Lippi daria lugar a Luiz Felipe Scolari, com o antigo selecionador português a repetir a conquista. Hulk, ex-FC Porto, trocou o Zenit de São Petersburgo pela Superliga Chinesa, por 50 milhões de dólares.
Hoje, o clube de Guangzhou não tem qualquer jogador estrangeiro no seu plantel.
O investimento chinês ultrapassou rapidamente as fronteiras da nação gigante. Chegou a Itália, onde os rivais do AC Milan e do Inter se tornaram propriedade de investidores chineses, tal como o Atlético de Madrid. Também os próprios organismos se aliaram a empresários do país asiático. Foi o caso da Liga Portuguesa, cuja segunda divisão chegou a ter o nome de um patrocinador chinês.
No caso dos clubes — ou das SAD —, o Vizela, que garantiu recentemente a permanência na principal categoria do futebol português, é atualmente detido por investidores chineses.