Este é o teu segundo livro. Como definirias este “O Caçador de Sonhos”?
Acho que é um titulo na mouche. Traduz muito o que me representa: o sonho de ser jogador de futebol, de abraçar projetos, é como as bolas de sabão, que quando as tentamos apanhar, elas desaparecem. Também os sonhos se vão sucedendo assim. Eu sou um bocadinho essa pessoa de desafios, permanentemente à procura de novos. Este é um livro para um público-alvo um pouco mais jovem, entre os 8 e os 14 anos, que já consegue perceber algumas mensagens que lhes são destinadas. Tenta misturar as minhas vivências no futebol com alguns ensinamentos que entendo serem importantes numa carreira de um jogador, como o comportamento dos pais nas bancadas, a relação com o treinador, as paixonetas, a conjugação dos estudos com o futebol… É a procura do sonho, mas não pode ser o sonho a qualquer custo.
Já te ouvi dizer que era o livro que gostarias de ter lido há 30 anos. Porquê?
Para conhecer melhor o que é isto do futebol. Nem tudo é cor-de-rosa, nem tudo vai dar certo. Há compromissos e sacrifícios a estabelecer. Há aqui um trajeto de muita paixão e amor ao futebol, mas também há coisas de que vamos ter de prescindir. Na faculdade, abdicar de saídas à noite ou da família, porque há algo maior a ser construído. Gostaria de ter lido sobre isso, porque aprendi tudo sozinho e pelas vivências que fui tendo. Da mesma forma que há muitos miúdos que se foram perdendo neste trajeto todo, felizmente eu — pelo suporte familiar que tinha e personalidade que fui construindo — não me desviei. É isso que eu gostaria de ter lido, porque ajudar-me-ia muito. Acredito que, hoje em dia, os miúdos também precisam de saber isto.
Na formação cada vez mais profissionalizada de jogadores que existe, a parte académica ou extra-futebol ainda é desprezada?
Acho que há aqui duas visões completamente distintas. Uma coisa são jogadores que são profissionais e estão a chegar ao topo da pirâmide, que vivem do futebol, e depois aqueles que estão a fazer o trajeto para lá chegar. A grande preocupação foi, claramente, apanhar estes últimos, os mais novos. Nem todos vão dar certo ou conseguir lá chegar. Nos clubes, nas academias e mesmo nalguns projetos governamentais, já há boas políticas para conciliar os estudos com o desporto. Está muito melhor do que há 20 anos e acho que no futuro será ainda melhor. Podemos vender o sonho, obviamente, mas temos de dizer a realidade aos miúdos: podem não chegar ao topo. E está tudo bem na mesma. Essa perda, muitas das vezes, pode ser muito abrupta e condicionar o futuro daqueles miúdos que têm a vida inteira pela frente.
Acho que foi o teu antigo colega Francisco Geraldes que falou do quão duro era que, na formação do Sporting, a cada ano vários miúdos fossem dispensados, tendo de conviver com a rejeição muito cedo.
Isso pode trazer traumas. É a realidade pela qual o Francisco passou num clube de outra dimensão, que é onde normalmente conseguem filtrar os melhores, mas mesmo assim isso acontece. Quantos jogadores com mais talento que eu passaram pelo meu balneário?
E não têm 500 jogos na I Liga… [na verdade são 345 encontros na I Liga, num total de 610 partidas no futebol profissional]
O talento não é o único fator determinante na construção da vida de um jogador. Se fosse só pelo talento, nunca teria conseguido chegar lá.