Estou de volta à Tribuna Expresso! Maioritariamente porque esta quarta-feira conseguimos finalmente surfar mas já lá vamos…
Terça-feira foi dia de absorver alguma cultura turca e irmos até à zona histórica de Istambul. Aparentemente, Istambul está dividida em três zonas: europeia (onde ficámos), asiática e histórica. Ainda não fomos à asiática mas só de mudar da europeia para a histórica, parecia um mundo novo! Turistas, muita gente a falar inglês e tudo feito para o turismo. Começámos por ir ao Grande Bazar, mas com um objetivo: queríamos autorização para conseguir que o Allen “skatásse” nos telhados do Bazar! Tinha tudo para serem as imagens de uma vida, mas mesmo com a ajuda do Furkan (amigo do Ricardo da Turquia que tem ajudado muito nas limitações da língua, principalmente), foi impossível subirmos até ao telhado!
Fomos guiados pelos polícias do Bazar até a um gabinete de administração onde nos disseram que gostavam de nos ajudar mas era mesmo preciso uma autorização especial do governo. Aproveitámos para dar uma volta pelo bazar, onde percebemos que o maior negócio da Turquia são lojas de joalharia. É incrível ver as montras e o que eles vendem!

O Furkan falou com um amigo que nos ia dar casa, perto do mar, e que ia até começar a fazer as brasas para um churrasco, que com toda a gentileza, decidiu fazer-nos.
Entre alugar carro, ir buscar as pranchas de surf a um amigo do Furkan e seguirmos até à zona do surf, a viagem durou algumas 5 horas. Uma carrinha cheia de malas, pranchas de surf e snowboard, mais 6 pessoas, não foi fácil e já estávamos todos exaustos, a começar pelo Ricardo que já nem falava, estava só concentrado na estrada para não haver vacilos nem perdas de tempo.

A vontade de fazer ali um convívio era grande, mas a exaustão era maior, e o cenário de dormida também não era muito feliz, muito devido ao facto de estarem temperaturas negativas dentro de casa. O Ricardo só comparava o frio que estava com o refúgio na montanha do Toubkal na edição passada. Com bom espírito e muita galhofa lá nos deitámos num quarto onde fiquei eu, o Bandeira, o Allen e o Ricardo, deixando o Pedro Mestre na divisão de baixo, na sala, onde ficaram temperaturas negativas ao longo da noite! Deu definitivamente o corpo às balas para podermos dormir com aquecedor no quarto de cima.
Por volta das sete da manhã, o despertador toca e é hora de arrumar tudo para ir procurar o surf no Mar Negro. Sim, no Mar Negro! Sei de pessoas que já surfaram aqui, mas teremos nós sido os primeiros portugueses a surfar no Mar Negro? Não quero ser a pessoa que dá esse claim mas se alguém pudesse confirmar, era fixe!

Dito isto, lá seguimos para o contacto que tínhamos de uma surfhouse que há aqui na Turquia, mais concretamente numa zona chamada Babali. Apanhámos o filho do dono, na surfhouse, e com a sua ajuda começámos à procura de spots para surfar. Swell havia, mas vento também. Cálculo que isto seja sempre assim, porque estamos num mar e para haver swell muito provavelmente seria sempre com vento. Ainda tentámos encontrar uns pointbreaks mas a verdade é que há muito mais opções de beachbreaks.
Ainda achei que ia surfar uma esquerdinha ao lado dum morro, mas quando nos aproximámos para ver a onda, era muito mais perto das rochas do que parecia e por isso não era opção. Acabámos por parar num beachbreak que tinha uma esquerda que parecia funcionar. Parámos o carro frente do pico, praticamente em cima da areia e começámos todo o processo de preparação para entrar na água. Há que mencionar duas coisas: a temperatura do ar estava nos 5 graus e a da água nos 3. Isto significa que iria ser sempre preciso fato quente, luvas, gorro e botinhas. Felizmente, a Dakine providenciou-nos todos os kits para estarmos preparados para este frio.
Foi giro ver o Allen a adaptar-se e a queixar-se do frio que estava, mas não deixou de entrar na água e tentar a sua sorte. Acabou por ficar no inside a apanhar as suas ondas, mas tenho a certeza que ficou feliz por poder dizer que surfou no Mar Negro. Já eu, o Ricardo e o rapaz local fomos até ao outside tentar a nossa sorte. Havia um pico de esquerda que tinha algum potencial, e acabámos por ter uma fria mas divertida sessão. O Ricardo e o miúdo surfaram cerca de 30 a 40 minutos até começarem a acusar o frio. Eu, sendo como sou, e sabendo que havia possibilidade de amanhã não haver ondas, fiquei na água quase duas horas. Tinha comigo a pressão de ter uma parte de surf minimamente decente no documentário, e a pressão de produzir algumas fotografias também e por isso não ia desistir por muito frio que estivesse! Claro que ao fim de algum tempo, o corpo começa a ceder ao frio e a cabeça começa a explodir a cada bico de pato.
Sei que não fiz o meu melhor surf, o mar estava complicado e nem consegui chegar ao ponto máximo da minha performance, até porque para mim é sempre estranho surfar de botinhas. No entanto, saí da água com a sensação de que tinha feito o que era suposto no que toca ao surf nesta expedição. Surfei no Mar Negro quase uma hora sozinho! Quantas pessoas, quantos surfistas profissionais no mundo podem dizer tal coisa? Não é este o conceito de surf? O que são campeonatos e ondas perfeitas (que sabemos todos que tem dado em Portugal), ao lado de surfar no Mar Negro? São memórias e conquistas que vão ficar comigo para sempre. Que venham mais destas.
* Este texto faz parte de uma série de crónicas escritas por um surfista (Filipe Jervis), um skater (João Allen) e um snowboarder (Ricardo Araújo) profissionais durante uma viagem à Turquia em busca de ondas, neve e ruas para rolar, fruto de uma parceria entre a Tribuna Expresso e a Dakine Expedition.