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Crónica

Se passarem em aeroportos, tenham cautela: cilindros de ar anti-avalanche dentro de mochilas podem ser um problema

Entre malas com câmaras de ar a suscitarem suspeitas em dois aeroportos, um túnel de 13 quilómetros no qual entraram com o sol a raiar e saíram com neve a cair e motos à espera para desbravar caminho no de um nevão, a viagem do surfista Filipe Jervis, do skater João Allen e do snowboarder Ricardo Araújo já os tem em elevada altitude na Turquia

Expresso

Pedro Mestre

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Por Filipe Jervis

Começou.

Um ano depois estou de volta à Expedição da Dakine. O ponto de encontro foi no aeroporto e foi aí que eu, o Allen e o Bandeira demos as “más” notícias ao Ricardo Araújo de que, no fundo, já sabíamos o destino. Fomos os três apanhados em pequenas coincidências: desde a senhora dos seguros de viagem ligar ao Allen a falar sobre a viagem à Turquia, ao sócio do Bandeira falar-lhe da viagem por motivos de trabalho, não sabendo que não era suposto ele saber. Claro que tivemos pena e acabou por ser o Pedro Mestre, o fotógrafo da viagem, o único a não saber.

Três malas de snowboard, três de pranchas e cinco de roupa são provavelmente o maior pesadelo de qualquer senhor do check-in e a verdade é que tivemos essa trabalheira toda várias vezes durante estes dias de viagem. Faz parte e já temos todos muita experiência nisto para saber lidar com a situação… A única que mexeu realmente comigo foi ao passar a segurança, tanto em Portugal como aqui na Turquia, juntamente com o Ricardo: tivemos que mostrar um cilindro de ar que está nas nossas mochilas que serve para libertar o airbag, no caso de haver uma avalanche. Inclusive, já no aeroporto de Istambul, o Ricardo teve que ir à polícia justificar o porquê de termos aqueles cilindros. Passada a segurança fizemos mais um voo, este domingo, para uma zona chamada Riza. Posso dizer que foi das aterragens mais bonitas que vi desde que viajo, o Mar Negro a banhar a cidade e montanhas cheias de neve a poucos metros do mar, incrível!

Chegados a Riza, tínhamos uma viagem de hora e meia até o sítio onde íamos ficar. Confesso que fiz mais perguntas ao Ricardo Araújo nessa viagem de carro do que nos últimos meses. Queria mesmo saber mais informações: Onde íamos ficar? O que íamos comer? Íamos passar frio a dormir? Havia sítio para comprar mantimentos? (Eu trouxe os meus, obviamente). E, sinceramente, ainda bem que ele não cedeu porque o que encontrámos foi muito melhor do que qualquer um de nós alguma vez imaginou. A única informação que ele passou foi: “Quando passarmos um túnel grande é porque estamos a chegar”.

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Realmente, o túnel era muito mais comprido do que qualquer outro que alguma vez passei, tinha os seus 13 quilómetros. Assim que passámos o túnel, tudo mudou. Entrámos com bom tempo, pouca luz mas ainda de dia, um caminho já com alguma neve nas montanhas e civilização perto da estrada, e saímos completamente de noite, a nevar, a estrada completamente coberta de neve e nenhuma alma viva ao pé de nós. Depois de alguns metros a conduzir em plena neve, deparámo-nos com um cenário que nunca algum de nós imaginou passar: três motas de neve a cortar a estrada à nossa espera para nos transportar para outro sítio.

A nossa cara quando percebemos que vamos viajar de moto de neve foi completamente imperdível, todo aquele momento compensou não sabermos nada de nada em relação ao que se ia passar! O que não sabíamos era que íamos ter cerca de 15 minutos com malas de roupa, malas de roupa e cinco pessoas a serem transportadas no meio de uma boa queda de neve. Frio, excitamento, adrenalina, pressão dos condutores por causa da hora e da neve, foi todo um conjunto de emoções que amenizaram assim que chegámos ao hotel Ovit. No meio da neve, no meio da escuridão.

Tiraram-nos tudo das motos enquanto nos sacudíamos da neve presa nos gorros e nos casacos, ao mesmo tempo que nos abraçávamos e agradecíamos, do fundo do coração, a experiência que o Ricardo Araújo e a Dakine nos proporcionaram uma vez mais.

Instalados, num grande conforto e quentinho, enquanto olhamos para a janela e vemos os -11.° e a neve a cair lá fora. Neste momento só penso no que é que me espera. O meu nervosismo está a desvanecer aos bocadinhos. Já estamos instalados, mas não deixo de ter um nervoso miudinho para saber o que lá vem porque, segundo o Ricardo, “há coisas planeadas para todos estes dias na neve”.

Resta-me esperar e a vocês também.

* Este texto faz parte de uma série de crónicas escritas por um surfista (Filipe Jervis), um skater (João Allen) e um snowboarder (Ricardo Araújo) profissionais durante uma viagem à Turquia em busca de ondas, neve e ruas para rolar, fruto de uma parceria entre a Tribuna Expresso e a Dakine Expedition.