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Crónica de Jogo

Para se ser campeão, é preciso jogar mais que 45 minutos. E para ganhar também (o empate que deixa o título para decidir na última jornada)

Sporting e Benfica empataram-se (2-2) entre equívocos de parte a parte, desperdiçando assim ambos os objetivos que tinham para este domingo: a equipa de Schmidt, que falhou completamente a abordagem ao jogo na 1.ª parte, deixou de festejar o título nacional e o Sporting, que desistiu de jogar na 2.ª parte, entregou com um lacinho um lugar de Champions ao SC Braga. O empate penalizou ambas as equipas. E foi merecido

Lídia Paralta Gomes

CARLOS COSTA

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O dérbi da penúltima jornada do campeonato foi, essencialmente, um dérbi de equívocos. Equivocou-se largamente Roger Schmidt ao entrar com Frederik Aursnes a defesa direito, ao deixar o meio-campo a Chiquinho, João Neves e João Mário, a dar espaço ao Sporting para se divertir alegremente pelas alas. E equivocou-se quase tão espetacularmente Rúben Amorim, ao desistir do jogo mal arrancou a 2.ª parte, ao dar conta da diferença de abordagem do Benfica, a subida de Aursnes no terreno, tirando Marcus Edwards, um dos melhores na 1.ª parte, para lançar Paulinho, avisando logo ali o que queria do que restava do encontro: aguentar atrás e tentar a sorte numa bola longa, apanhando o Benfica desprevenido, demasiado balançado para a frente.

E por isso não poderia haver outro resultado neste jogo. O empate (2-2) penaliza as duas equipas, porque o Benfica deixa tudo para resolver na última jornada e o Sporting desbarata definitivamente uma possível recuperação até ao 3.º lugar e aos cifrões da Champions. É merecido, para ambos, porque em questões de erros o futebol é muito democrático: raramente perdoa, para qualquer que seja o lado. Para os adeptos, todos, das duas equipas, não deve ter existido jogo mais frustrante na temporada.

CARLOS COSTA

O cliché redundante das “duas partes completamente distintas” terá sido inventado para jogos assim, porque o que se viu foi, de facto, dois jogos num só. O Sporting entrou muito bem, a conseguir facilmente destruir a pressão alta que o Benfica havia ameaçado fazer nos primeiros minutos e lançando o seu jogo para as alas, onde Nuno Santos e Esgaio tragaram Aursnes e Grimaldo com facilidade.

Conseguindo quebrar as linhas com um jogo intenso e rápido, o Sporting podia ter marcado logo aos 21’, numa jogada em que Edwards arrastou dois adversários na direita para depois com o calcanhar deixar a bola para a corrida livre de Esgaio. O cruzamento foi perfeito, mas Pote falhou completamente a bola. Nem um Bryan Ruiz foi.

Super competitivo nos duelos, o Sporting não deixou uma bola por ganhar na 1.ª parte - o Benfica era uma equipa nervosa, manietada, sem capacidade de construir, porque nem sequer capacidade para ter bola havia. E depois de mais uma ameaça de Esgaio, o golo do Sporting surgiu naturalmente, numa jogada pela esquerda, com Nuno Santos, com todo o espaço do mundo, a encontrar Trincão na área, que aproveitou um corte defeituoso de António Silva para ficar frente a frente a Vlachodimos. Não foi à primeira, seria na recarga. Aos 39’ o Sporting estava na frente e justificava. O 2-0, aos 44’, por Diomande, de cabeça após canto, dava um volume pouco escandaloso à superioridade da equipa de Rúben Amorim na 1.ª parte.

Só que na segunda tudo mudou. Schmidt apercebeu-se do erro de ter entrado em campo com Aursnes a lateral direito e deu ordem de subida ao norueguês, tirando João Mário de campo. O nórdico rematou com perigo logo nos momentos iniciais, numa jogada em que se viu logo outro Benfica: com mais intenção, com mais vigor na disputa do jogo. E perante tal demonstração, Amorim agiu no imediato, lançando Paulinho. O ataque móvel deixava de ser móvel. Provavelmente deixava de ser de todo um ataque: o Sporting abdicou da bola, optou por jogar na especulação do jogo, nos possíveis contra-ataques que o Benfica, balanceado para a frente, poderia conceder. Tal raramente aconteceu. E quando aconteceu, aos 86’, Paulinho falhou em frente a Vlachodimos, permitindo a defesa do grego.

NUNO VEIGA

Aos 71’, e já depois de ter falhado uma oportunidade, Aursnes faria o 2-1, após cruzamento de Grimaldo, confirmando que o seu lugar não era lá atrás. Por essa altura, já Schmidt tinha desfeito todo o plano inicial e retirado gente sagrada como Gonçalo Ramos e Rafa para lançar Musa e Guedes. O Benfica melhorou significativamente, embora a reação ao golo não tenha sido fantástica. Os minutos que se seguiram foram até os melhores de uma exibição paupérrima do Sporting na 2.ª parte e Morita esteve perto de aumentar a vantagem dos leões, após boa jogada de Bellerin, talvez a única substituição que correu bem aos da casa. Minutos depois, incompreensivelmente, Amorim retirou o nipónico de campo, lançando o jovem Dario Essugo que continua a não justificar a aposta, para mais em jogos deste calibre.

Nos últimos minutos, o Benfica voltou a carregar, mais atabalhoadamente do que se esperaria de uma equipa que entrou em campo com a possibilidade de ser campeã, mas nisto, para se chegar a um objetivo, seja um título ou ganhar um jogo, é preciso estar lá 90 minutos e não só pela metade. Vale para ambas as equipas. Já nos descontos, um remate de Musa contou com um corte decisivo de Coates e já com quatro minutos em cima do tempo regulamentar uma jogada de confusão na área terminou com um remate afoito de João Neves, com a bola a entrar pelo único espaço onde não existiam corpos vestidos de verde e branco.

O castigo foi merecido para o Sporting, porque desistiu de jogar. E para o Benfica, porque deu 45 minutos de avanço. Ninguém deve ter ficado feliz. Mas vossa culpa, vossa tão grande culpa.