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Crónica de Jogo

Midtjylland - Sporting. Na frente é que está a virtude de Pote

Pedro Gonçalves marcou dois golos na vitória do Sporting na Dinamarca por 4-0, confirmando assim os leões um lugar nos oitavos de final da Liga Europa e o internacional português as palavras de Rúben Amorim, que na véspera havia reconhecido que o seu habitat natural é perto da baliza

Lídia Paralta Gomes

Lars Ronbog/Getty

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Um planeamento da época que falha vê-se em algo mais ou menos assim: ser obrigado a pegar no melhor jogador da equipa e recuá-lo para terrenos onde cumpre, mas não brilha. Pedro Gonçalves chegou ao Sporting após uma época no Famalicão a jogar a médio atacante, atrás da linha mais ofensiva da equipa. Em Alvalade, tornou-se um avançado completo, marcador de golos e passador para outros: naquele 3-4-3, era no 3 e não no 4 que ele azucrinava a vida a defesas alheios.

Com o adeus de Palhinha e Matheus Nunes, a linha média do Sporting tornou-se, subitamente, um problema. Se Ugarte encaixou finamente, a substituição de Nunes revelou-se mais calamitosa. Morita é um bom médio, mas aqui e ali acometido por problemas físicos, o grego Sotiris é uma incógnita até hoje, Mateus Fernandes aposta intermitente e Mateo Tanlongo ainda agora chegou. E, sem opções em tempos de necessidade, foi Pote a colar remendos numa linha onde a baliza lhe está demasiado longe.

A antevisão ao jogo com o Midtjylland pareceu uma espécie de premonição antes da hora do treinador do Sporting, que reconheceu que o planeamento da próxima época terá de ter em conta uma verdade universal: Pote é para jogar à frente. Contra o Chaves, no último jogo para o campeonato, o rapaz de Vidago marcou mal se viu a deambular no seu habitat natural. E na Dinamarca, num jogo de nervos para o Sporting, que terá na Liga Europa oportunidade única para se redimir de uma época de equívocos, voltou a escrever com os pés uma frase que se pode tornar desde já feita: na frente é que está a virtude de Pedro Gonçalves.

Talvez precise o Sporting de enviar um agradecimento oficial a Paulinho, não o seu Paulinho mas o Paulinho dos dinamarqueses, expulso em questão de minutos ainda na 1.ª parte. O Sporting até já ganhava, golo de Coates aos 21’ num lance de confusão na área, com Dalsgaard, como o outro, a chutar para a barra para não ceder canto antes do uruguaio ir lá à sobra. Mas o Sporting não merecia: naqueles primeiros 20 minutos de jogo, foram largos os momentos em que os leões viram a bola ao longe, a passear de pé de jogador do Midtjylland para pé de jogador do Midtjylland. Aos 17’, Adán salvou um cruzamento disfarçado de remate e talvez tenha sido essa a única ocasião flagrante da equipa da casa, mas o jogo punha-se feio para os portugueses.

Lars Ronbog/Getty

Com o golo de Coates a pressão amainou, mas não fugiu. O central, aliás, quase oferecia o empate ao tentar um corte artístico de calcanhar, que se transformou em ataque perigoso do adversário. E ainda antes de se ver a jogar em superioridade, Marcus Edwards achou lógico tentar um chapéu e não um drible (coisa em que é bom) a um guarda-redes de 1,95m quando se viu isolado no ataque. O Sporting poderia ter terminado a eliminatória ali mesmo.

A expulsão de Paulinho, dois minutos depois, aos 38’, confirmaria esse desiderato leonino. A partir daí, o Midtjylland quase desapareceu e a 2.ª parte foi um exercício de gestão e ataque do Sporting, com Pedro Gonçalves a surgir como agitador-mor. Aos 50’ fez o 2-0, num vólei perfeito a partir da esquerda, sem deixar cair a bola, um remate de vibe quase vanbastiana, perdoem o exagero (que é), a entrar junto ao poste mais afastado de Lossl.

Depois de tantas dificuldades em ter bola na 1.ª parte, o Sporting praticamente pôs e dispôs dela na 2.ª e aos 77’ até lhe chegou a sorte, com Pote a bisar em mais um remate cruzado, mas que desta vez encontrou um rival pelo caminho, entrando ao primeiro poste. O 4-0 contará mais para o resultado e para futuros vídeos de bloppers do futebol do que para a história deste jogo, com Stefan Gartenmann a passar a bola para a própria baliza, não percebendo que o seu guarda-redes estava na ponta oposta. Acontece.

O que não acontece com frequência esta época é o Sporting vencer jogos fora em sequência, são três seguidas agora, coisa inaudita esta temporada. As péssimas indicações da 1.ª mão deste jogo do playoff ainda surgiram na 1.ª parte, mas a equipa de Rúben Amorim soube aproveitar as circunstâncias para fazer um encontro não fantástico, mas bastante sólido. E com Pedro Gonçalves a ouvir as palavras do seu treinador e a mostrar desde logo que o seu lugar é ali na frente, com a baliza à mercê.