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Um contra todos no Rali de Portugal

O finlandês Kalle Rovanperä dominou o segundo dia da 56.ª edição do Rali de Portugal, este sábado. Só um imprevisto no derradeiro dia (domingo) o impedirá de repetir a vitória do ano passado na prova portuguesa

Rui Cardoso

Paulo Maria

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Na crónica de sexta-feira falei-vos das velhas glórias do automobilismo português que, a convite do município local, assistiram à parte final do troço da Lousã (Giovanni Salvi, Manuel Romão, Carlos Bica, etc). E é justamente comparando os velhos tempos e a atualidade que começo o texto de hoje, dedicado ao segundo dia (sábado) da 56.ª edição do Rali de Portugal.

Não se trata de comparar Markku Alén com Sébastien Loeb ou Michele Mouton com Kalle Rovanperä, ainda que fosse sempre divertido, mais que não fosse por puro exercício especulativo, pensar o que os ases do passado conseguiriam fazer com os carros de hoje em dia. Um exercício sempre polémico, se pensamos na Fórmula 1 e na famosa tirada de Nikki Lauda quando Schumacher dominava os grandes prémios, com o austríaco a dizer que, com tantas ajudas eletrónicas, até um chimpanzé seria capaz de guiar aqueles carros…

É claro que entre os bólides de outros tempos e os atuais carros de topo do WRC há um abismo tecnológico e enormes progressos em matéria de segurança e mesmo de impactos ambientais. Os famosos carros do Grupo B da década de 1980 tinham potências alucinantes que passavam os 600 cv. Para se agarrarem ao solo precisavam da aerodinâmica e tinham imponentes asas traseiras. Alguns, como os Peugeot 205 e Renault 5 turbo, eram perigosamente leves. Outros, como o Audi Quattro, pareciam furgões rebaixados. Eram quase todos de caixa manual. Os WRC deste ano (Toyota, Ford e Hyundai) têm motores híbridos (capazes de funcionar em modo 100% elétrico em pequenos percursos como os parques de assistência e zonas urbanas). Usam gasolina destilada de resíduos orgânicos. São todos de tração integral e com 400 cv, contando só com os motores térmicos. As caixas de velocidades são sequenciais, comandadas por patilhas no volante.

Coisas de segundos e de minutos

A outra diferença tem a ver com a escala de tempo. Nos velhos ralis, a unidade de medida de tempo era, por via de regra, o minuto. Na famosa edição de 1981 do Rali de Portugal, Markku Alén perdeu mais de meia-hora depois de ter batido na Peninha e acabado o troço em marcha-atrás. Acabaria, no entanto, por vencer com nove minutos de vantagem sobre Henri Toivonen. Num rali como o deste ano em Portugal, as diferenças são ao segundo. Kalle Rovanperä (Toyota) acabara o primeiro dia com escassos 11 segundos de vantagem sobre Esapekka Lapi (Hyundai). Uma vantagem que, mesmo dominando completamente os troços disputados no sábado, apenas se alargou para a fasquia dos 59 segundos (neste caso relativamente já não a Lapi, mas ao seu companheiro de equipa Dani Sordo).

Dito tudo isto, não é ditirâmbico dizer que o nosso rali continua a ser o melhor do mundo. Na sexta-feira pude apreciar o virtuosismo dos pilotos nas sucessões de ganchos a descer da Lousã. Hoje, num cenário completamente diferente, num local só frequentado pelos mais finos apreciadores do rali, como é o caso dos elementos do Clube Automóvel de Amarante e do seu presidente António Jorge, cuja preciosa ajuda agradeço) foi a vez de apreciar uma das zonas mais rápidas da prova, situada por alturas do km 10 do troço de Amarante (o mais longo deste rali com cerca de 37 km de extensão). É uma longa reta ligeiramente a descer e que no final torce um pouco à direita, antes de entrar numa zona sinuosa. Fica no meio da mata, umas boas curvas de nível acima dos viveiros do Fridão. Se quisesse fazer uma piada fácil diria qualquer coisa como “assim se vê/a força do WRC”. Os carros começam a ouvir-se ao longe e de súbito aparecem ao início da reta e cobrem a distância que os separa de nós num abrir e fechar de olhos, fazendo um mini-salto e deslizando para a direita. É um sítio onde se anda a sério. O ano passado, técnicos da Hyundai estiveram neste local com um radar e terão registado velocidades de 170 km/h. Não é para todos…

O dia de Rovanperä

Findo este segundo dia do rali, Rovanperä, campeão em título e vencedor da edição do ano passado em Portugal, alargou o fosso que separa o seu Toyota (o único em prova) dos três Hyundai que o seguem, pondo Dani Sordo praticamente a um minuto de distância (seguindo-se nos restantes carros da marca coreana, Thierry Neuville a mais 11,8 segundos e Lapi a mais 2,7, sendo o único Ford em prova, o de Ott Tänak o quinto, a mais de um minuto do terceiro Hyundai). Isto quando, em declarações feitas no final de Vieira do Minho 2, Amarante 2 e Felgueiras 2, classificativas que Rovanperä venceu, este dizia, provavelmente sem ponta de maldade, que até já estava a tirar pé do acelerador e a começar a fazer gestão da vantagem. Que faria se assim não fosse…

No WRC 2, a vantagem ia para Oliver Solberg em Skoda, enquanto nos portugueses esteve acesa a luta entre Armindo Araújo (Skoda) e Miguel Correia (também em Skoda).

Domingo, numa manhã preenchida que finalizará o rali, os concorrentes passarão duas vezes no famoso troço de Fafe (o dos saltos de Pereira e da Pedra Sentada) às 8h35 e 12h15, percorrendo ainda Paredes (às 07h05) e Cabeceiras de Basto (às 09h35).