Quando a maldita notícia da morte de Gianluca Vialli deu um aperto de mão à luz do dia, sucederam-se os testemunhos. Falavam todos num cavalheiro, num grande homem, em alguém especial, era tão boa pessoa como futebolista. Um craque. Uma alma bonita, como chegou a dizer o amolecido Graeme Souness, com quem esteve dois anos na Sampdoria. As palavras que todos queriam ouvir, no entanto, ainda não haviam pintado a ressaca do desaparecimento de uma lenda bondosa e gloriosa da Serie A.
Roberto Mancini e Gianluca Vialli, ambos com 58 anos (embora a contagem siga agora por estradas diferentes), conheceram-se quando tinham 16 anos. Numa entrevista para a Rai, no programa “Che tempo che fa”, Vialli admitiu que Roberto já era o seu “herói” desde os 14. “As pessoas já falavam nele na altura…”
“Conhecemo-nos aos 16 anos e nunca mais nos deixámos”, contou o atual selecionador italiano, em entrevista ao “Corriere dello Sport”. Tudo começou nas equipas jovens da federação italiana, mas onde toda aquela química se transformou em brisa do céu foi em Génova, dentro da camisola da Sampdoria. Ganharam um campeonato contra lendas ainda esvoaçantes dos relvados, conquistaram três edições da Coppa, perderam uma final da Taça dos Campeões Europeus, em Wembley, e celebraram uma Taça das Taças, uma final contra o Anderlecht em que os dois golos que ditaram o desfecho só apareceram no prolongamento. Os golos foram de Gianluca Vialli, o camisola 9.

Alessandro Sabattini
A derrota em Wembley, diante do Barcelona de Johan Cruijff, foi como um papão no estômago de Gianluca Vialli durante alguns anos. Muitos anos depois, o futebol devolveu-lhe uma alegria, exatamente no mesmo palco. “Ele teve um papel chave na nossa vitória no Campeonato da Europa. Os jogadores adoravam-no”, revelou Mancini, recordando o chefe de delegação que acompanhou a equipa técnica composta por ex-futebolistas da Sampdoria.
“Aquelas duas noites em Wembley… há muitos anos chorámos de dor e angústia, e depois chorámos de alegria por estarmos juntos pelo destino antes de ele morrer.” O abraço entre ambos, tão recordado depois de o cancro no pâncreas levar Vialli para a pátria da nostalgia, foi mágico e talvez o grande momento do Euro 2020, jogado no verão de 2021, devido à pandemia de covid-19.
Roberto Mancini garantiu na conversa com o desportivo italiano que Vialli deu ao grupo “a coragem que não conheciam” e que ele havia usado para combater a doença que o castigava desde 2017. “O Gianluca era o melhor de nós, um homem perfeito e corajoso. Foi um privilégio ser amigo dele, colega no futebol e na vida.”
O ex-futebolista e agora treinador recordou ainda que recentemente havia perdido “outro irmão”, Sinisa Mihajlovic, que também dividiu balneário na Sampdoria e Lazio com o mago que pregava a beleza como forma de jogar futebol. Mancini despediu-se de Vialli no dia 29 de dezembro, quando o visitou no hospital. O lendário avançado de Cremonese, Sampdoria, Juventus e Chelsea estava “sem força e com pouca voz”, mas “muito lúcido".
E desabafou: “Com a força dele, eu vou seguir em frente para dedicar-lhe algo relevante, algo com que temos sonhado a vida toda”.