Morram os Dantas, morram, pilim!
Este mercado de transferências de Benfica e FC Porto enterrou o ideal da formação; no Seixal e no Olival forma-se para fazer dinheiro e reequilibrar contas. É o que é e o melhor é assumir que é assim
07.10.2020 às 14h03

Gualter Fatia
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Apanhar Luís Filipe Vieira em contradição é um dos passatempos preferidos de toda a gente hoje em dia. Primeiro, porque é um exercício fácil; segundo, porque é um exercício cada vez mais fácil, pois o tempo que passa entre o que Vieira diz como verdade absoluta e o que a realidade vem desmentir é cada vez mais breve, basta uma memória a curto prazo razoavelmente afinada.
A formação como princípio, o fim da formação, o treinador para sempre e o treinador despedido, a ideia do Benfica campeão europeu que persiste, com algumas variações – sabem do que estou a falar.
O presidente dos encarnados é vítima da vontade irresistível que tem de se expôr e o último falhanço de relações públicas está relacionado com o tema mais discutido no tal universo benfiquista: o empréstimo de Tiago Dantas ao colossal Bayern de Munique com uma cláusula de opção de compra no valor de 8 milhões de euros.
Dantas tem 19 anos, tinha dez de Benfica e era até segunda-feira a reserva moral da direção da Luz para suster críticas: acontecesse o que acontecesse, não iria haver outro momento Bernardo Silva, nenhum miúdo talentoso abandonaria o Seixal assim, do nada.
Mas Tiago Dantas saiu, como saíram Florentino Luís (Mónaco), Jota (Valladolid), Tomás Tavares (Alavés), David Tavares (Moreirense) e Rúben Dias (Manchester City), este em circunstâncias irresistíveis. Do Seixal resistem Nuno Tavares, Francisco Ferro, Gonçalo Ramos e o regressado Diogo Gonçalves, e entraram Darwin Ñunez (€24 milhões), Everton (€20 milhões), Pedrinho (€18 milhões), Waldschmidt (€15 milhões), Otamendi (€15 milhões), Gilberto (€3 milhões) e Todibo (€2 milhões, por empréstimo).
Conclui-se que o paradigma do Seixal, durante anos o mantra desta direção, é agora insuficiente para o programa do Benfica, obrigando até Domingos Soares de Oliveira a um difícil ato de contorcionismo. Se no início da pandemia a receita aconselhável era a prudência - foi o que ele afirmou -, a seguir Soares de Oliveira reanalisou o mercado e viu sinais positivos.
Resultado, “constata-se que o Benfica encetou um elevado investimento com vista a atingir os objetivos a que se propõe na temporada”, escreveram esta quarta-feira os encarnados na respetiva newsletter. Quanto aos jovens cedidos, o SLB garante que é uma “forma de adquirirem experiência e consolidarem o seu crescimento de forma a estarem mais bem preparados para representarem o clube”, como “Diogo Gonçalves, que regressa agora ao clube após dois anos a jogar e evoluir noutras paragens”.
Aparentemente, há um plano.
E esse plano também está a ser decalcado pelo FC Porto, que além das vendas obrigatórias de Alex Telles (15 milhões de euros para o Manchester United) e de Danilo (empréstimo com cláusula de compra obrigatória de €16 milhões) para aguentar as contas, decidiu pôr os seus jovens ao largo: Fábio Silva (vendido por €40 milhões de euros ao Wolverhampton), Vítor Ferreira (emprestado com opção de compra de 20 milhões de euros, também ao Wolverhampton), Tomás Esteves (emprestado ao Reading) e Diogo Queirós (cedido definitivamente ao Famalicão).
Isto é Seixal vintage, feito à discrição, mas com discrição, protegendo Pinto da Costa de algumas críticas que lhe podem ser feitas pelos mesmos motivos: a realidade que o desmente. Porque no final do triunfo na Youth League, em 2019, Pinto da Costa afirmou que os miúdos iam “ter um futuro brilhante” e que uma conversa com Sérgio Conceição lhe tinha dado garantias de que jogariam na equipa portista. E porque um dos comunicados do FC Porto, quando o presidente foi reeleito há meses para outro mandato, dizia o seguinte: “Reeleito recentemente para mais um mandato de quatro anos, Jorge Nuno Pinto da Costa insistiu na qualidade da formação do FC Porto e garantiu que seria uma aposta forte para o futuro próximo”.
O mais sensato, para todos, seria admitir que a formação é um negócio e não um ideal.
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